quinta-feira, 4 de setembro de 2008

ECT

Desde que aprendi a ler, minha vida era mandando carta. Adorava escrever, fazer um desenho no final e assinar embaixo. Achava o máximo poder assinar alguma coisa. Depois eu dava para minha mãe revisar e ver se estava tudo dentro das normas da ABNT. Na verdade, ela me dizia se alguma coisa estava soando legal ou não e eu sempre fazia mais de uma até o veredicto final. Minha mãe era uma espécie de copydesk das minhas ingênuas cartinhas.

Mandei milhares delas para Os Trapalhões, Bozo, Turma do Balão Mágico e Clube do Mickey. Nem me importava em não ser sorteada. Só em saber que o que eu escrevera com tanto capricho estava naquela montanha, era o suficiente para mim. Minhas cartas eram importantes!

Ganhei um bloquinho que vinha com uma caneta super estilosa, com estampa do Snoopy e sua turma. Ganhei também a Gordinha da Sorte, uma caneta vermelha com ponta porosa e tinta preta, com a foto e assinatura de Didi, o meu preferido do quarteto, presente da minha também Tia Didi.

Já adulta, essa mania fez com que eu mantivesse amizades à distância e alguns namoricos também. Tenho em Salvador uma caixa com todas as cartas que troquei com diversos amigos, algumas delas com fotos, postais, desenhos, orações. A maioria delas começa sempre com alguma desculpa pela letra, talvez a versão da década de 90 para as tão famosas "mal traçadas linhas". A resposta era sempre imediata e a ansiedade pela resposta da resposta era um capítulo à parte.

Tinha um colega de sala na faculdade que trabalhava na agência central dos Correios. Todas as segundas e quartas ele me perguntava se não tinha nenhuma encomenda, já que não pegava fila e tudo o que eu mandava por ele chegava mais rápido. No final do ano lá ia eu comprar inúmeros cartões da Unicef para mandar até para os meus primos. Fazia questão de escrever alguma coisa personalizada em cima da mensagem original, pois nunca gostei de votos de boas festas no atacado.

Tenho saudades daquela época romântica, tão destoante do meu jeito amalucado e prático de ser. A espera por notícias de quem morava tão perto e tão longe ao mesmo tempo era um exercício diário de paciência para mim. Era um antídoto à minha tão famosa ansiedade nata. O trajeto de casa até a agência era uma terapia. Deixava para lacrar o envelope em cima da hora, com aquela goma melequenta que ficava no balcão, junto ao caixa. Afinal, tinha que dar a lida final, pois tudo deveria ser impecável. O que se escreve se lê e fica para a posteridade.

Ainda há quem mande cartas? Quanto custa um selo?

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