sexta-feira, 31 de julho de 2009

O valor das coisas

Almoço no mesmo lugar há um ano e oito meses. Lembro que no meu primeiro dia de trabalho perguntei aflita a uma colega onde poderia almoçar com a merreca que ia receber de vale-refeição, já que a empresa fica numa área nobre da cidade e tudo é muito, muito, mas muito caro mesmo. 

Ela me disse que tinha uns restaurantes mais ou menos, onde se podia comer razoavelmente bem por nove, dez reais. Eu, gastar dez conto de comida por dia??? Jamé, como diz meu pai. Bom, minha colega me explicou onde ficavam os restaurantes menos badalados e eu, com minha santa maluquice, acabei indo parar em outro lugar. 

Meus colegas quase caíram para trás quando souberam onde eu tinha almoçado: segundo eles, todo mundo que comia lá passava mal. Apelidei o restaurante de "infecção" e não deixei de frequentá-lo. Afinal, menos de dois reais por 100 gramas tem seu glamour. 

Na segunda semana como frequentadora assídua, ganhei um cartão fidelidade que me daria direito a um almoço grátis a cada vinte carimbos. A cada dez seria um suco e a cada 15 uma sobremesa. Na semana seguinte, os funcionários já sabiam o meu nome, inclusive a dona, uma simpática oriental. O lugar é simples, a comida é básica, mas os banheiros são impecáveis e eu, como cliente fidelíssima, me sinto cercada de mimos que não receberia em outro lugar pagando o que pago: junto com o cafezinho que é de graça, fica um potinho com bolo de sabores que variam conforme o dia da semana. Às sextas-feiras, para compensar a falta do carimbo no cartão fidelidade, ganhamos gelatina. 

Passei a observar os frequentadores e fiz até um mapeamento interessante: na primeira quinzena do mês divido a mesa com mecânicos de uma concessionária Renault que tem ao lado, assim como com copeiras, recepcionistas e estagiários das empresas vizinhas. Na segunda quinzena, a clientela passa a ficar mais chique, com direito a paletós, gravatas e Ray-Bans. 

Um dia eu me aborreci muito no trabalho e acabei não segurando o choro lá. Imediatamente a dona me levou para uma salinha no terraço, me perguntou se tinha sido alguma coisa muito grave e me deixou lá com um copo d´água com açúcar. Tudo muito discretamente e ninguém mais tocou no assunto desde então. Voltei de férias na segunda passada e chamei uma outra colega para almoçarmos lá e ela disse que tinha medo. Eu disse que pagava a conta e ela acabou cedendo. Depois de ter se esbaldado no feijão com arroz e no pudim, meio sem jeito por ter que dar o braço a torcer, me disse: “É por isso que o seu VR sobra todo mês”.