Josiane não aguentava mais as investidas de Maurílio, o galã daquela área do Macuco, Zona Portuária de Santos. Trabalhavam numa das inúmeras empresas de armazenagem de grãos para exportação da região. Ele, gerente de T.I. e chefe da CIPA; ela, auxiliar fiscal.
Quando chegou no seu primeiro dia de trabalho, há cinco
meses, foi ele quem providenciou o seu “kit boas-vindas” com o nome da empresa,
que consistia numa squeeze de plástico cheirando a tinta tóxica, caneta, caderno,
crachá, capacete e colete de segurança, este amplamente sinalizado, já que
passariam mais de dez horas por dia, seis dias por semana, numa das áreas mais
perigosas do silo: a área administrativa.
Essa área ficava no final de um labirinto de colunas
redondas e paredes de vidro. Era a base da estrutura cúbica de concreto, que
media trinta metros de altura, armazenando, ininterruptamente, doze mil toneladas de grãos. Não foram poucas as noites
em que sonhou que tudo aquilo desabava e ela não conseguia achar a saída,
acordando com falta de ar e muita preocupação.
Até tolerava as piadinhas vindas dos caminhoneiros que
faziam fila na entrada da empresa, centenas deles por dia, uma fila
interminável de caminhões vindos de todas as partes do Brasil, com os mais
diversificados sotaques. Chegou a fazer amizade com alguns, ganhou mimos de
outros, se achava sexy quando a engoliam com os olhos.
Mas Maurílio a incomodava. Muito. Demais. Ela sabia de um
lance que falavam sobre assédio, mas achava que isso só se aplicava a casos
muito extremos. E Maurílio era sutil. Mas incomodava. Ela não podia se dar ao
luxo de perder aquele emprego que pagava em dia, era “registrada, de carteira
assinada, plano de saúde Unimed”, um luxo sem precedentes na sua vida.
A sutileza dele estava em ir para cozinha quando ela
estava só e elogiar a sua beleza. Mostrava e enviava vídeos eróticos pelo
celular, dizia que era porque ele mandava para todo mundo que era da galera. Se
ela estava na máquina de xerox, ele passava por trás roçando no seu corpo, para
ela sentir que ele não ia sossegar enquanto não alcançasse o seu objetivo.
Um dia, Josiane cedeu. Estava triste, chovia e já estava há
mais de uma hora esperando pelo primeiro de dois ônibus, da sua longa jornada de
volta para casa. Aceitou a carona de Maurílio, que perguntou se ela não queria
tomar um suco antes de ir para casa. O suco virou chope, um chope virou cinco,
vieram os beijos e concluíram a noite na cama de Maurílio.
No dia seguinte, não entendeu quando, sorridente,
desejou-lhe bom dia e ele fez de conta que não escutou. Também queria saber o
porquê de a porta da sua sala ter permanecido trancada durante toda a manhã. Esperou
pela hora do almoço e não acreditou quando o ouviu falando com um colega: “pronto, ganhei, tá me devendo umas breja”.