terça-feira, 18 de novembro de 2008

Ponto Com

E foi por telefone que eu soube que o meu e-mail era cynthiacastro@zipmail.com.br . E que minha senha provisória era 123456. O primeiro. O primeiríssimo. Pronto, ali começava a minha tardia inclusão digital. Eu tinha um item a mais para colocar no meu currículo. Eu podia mandar e-mail para o meu então affair que morava na Califórnia. Estava feito o estrago.

A responsável por isso foi uma grande amiga, atualmente leitora habitual desse pretensioso bloguitcho. Aliás, foi na casa dela que eu dei o primeiro pulo de susto ao ouvir o sinal do modem discando, lá pelo final da década de 90. Foi ela quem me apresentou o universo virtual, me ensinou a fazer buscas no Alta Vista e me indicou um monte de sites de relacionamentos legais – tudo muito nos primórdios da internet, nada de fotos, de sons, de questionários infindáveis a serem respondidos. Era tudo na mão grande mesmo, a gente tinha que escrever bem pra mostrar que era interessante. Tudo muito misterioso. A imaginação voava alto.

No bate-papo do extinto ZAZ, ganhei não só fluência no italiano como também três amigos do peito: Tino e sua família maravilhosa, Marco e Luciano. Conheci também um maluco que me mandou dez dúzias de rosas vermelhas diretamente da Itália, abalando as estruturas da minha pacata rua, e depois sumiu. Talvez tenha sido alguma jogada de marketing da floricultura, vá saber.

No Almas Gêmeas, conheci de tudo – inclusive o meu ex-marido. Eu não conseguia imaginar onde tanta tecnologia ia chegar. Pior: já não conseguia mais viver sem ela.

No ICQ (ôô), eu passava minhas tardes de sábado conversando com gente que nem conhecia. A Conexão era lenta e caía bastante. Mas continuava sendo interessante, divertido e atual. Vieram o MSN e o Google, mas não me interessava mais tanto por isso nessa época. Minha vida tinha mudado bastante e eu tinha mais o que fazer do que ficar diante do computador por horas a fio. Preferia jogar paciência a conversar no MSN – só me cadastrei há dois anos, by the way. Se estava a fim de falar com alguém, pegava o telefone e ligava. Não tinha mais saco para teclar.

Num domingo ensolarado, depois da praia e na fila do Bom Preço pra pagar a farofa do almoço, vi a reportagem de capa da Veja dizendo que a sensação do momento era o Orkut, um seletíssimo grupo na internet onde só tinha acesso quem recebesse convite de um dos membros. Achei aquilo meio distante da minha realidade. Achei infantil, engraçado, jamais iria fazer parte daquela idiotice. Mas a febre orkutiana empesteou os meus amigos e a cobrança para que eu entrasse veio junto. Lembro, como se fosse hoje, que fiz tudo de maneira inocente, querendo reencontrar aqueles que tinham ficado em algum lugar do passado. Nem coloquei foto, achava desnecessário. Queria falar com as pessoas que tinham feito parte de minha vida, saber como elas estavam, coisa ingênua mesmo. Os meus scraps eram sem noção – lembro da vez em que escrevi algo ultra confidencial para uma amiga e levei o maior puxão de orelha.

Fui instruída por minha irmã a participar de comunidades. Tudo bem, vamos a elas. “Só que tem que ser comunidade grande, Cynthia”. Ah, tá. Não sabia. Lá fui eu refazer os meus cadastros em comunidades. Comunidade que bombava era a que tinha mais de 1.000 membros. Ficava bem na fita. Enfim, regra é regra.

Pouco tempo depois, passei por problemas pessoais sérios e minha relação com o Orkut passou a ser de amor e ódio: ao mesmo tempo em que me fez sofrer ao saber de coisas que eu não imaginava que ia passar, também me fez reencontrar grandes amigos de infância, pessoas que eu sequer imaginava que se lembrassem de mim. Também conheci dois amigos verdadeiros – isso compensou tudo de ruim que vivi.

Hoje eu vejo as coisas de outro jeito, mas voltei a usar os sites de relacionamento para encontrar pessoas – digo pretendentes, paqueras, affairs. Por n motivos, voltei a ser figurinha carimbada em todos eles. Já o Orkut, para mim, é uma espécie de pombo-correio, onde os álbuns mostram o grau de sucesso em algum aspecto da vida do seu dono. Virou prateleira de locadora de filmes de comédia ou de finais sempre felizes. Bom, nesse caso o meu filme está longe de terminar...

2 comentários:

Anônimo disse...

O virtual é o espelho do real. Simples assim com todas as coisas boas e ruins que isso possa trazer.
Site de relacionamento é o barzinho de quem não está a fim de sair de casa. Praticamente nenhuma diferença eu penso. Em ambos a pessoa com quem você interage é uma caixinha de surpresas. Num primeiro momento cada qual tem as suas vantagens. "In loco" vc conhece mais a embalagem e no virtual o conteúdo intelectual é mais evidente. Mas nada que um pouco de conversa ou recursos tecnológicos como uma webcam não possa assemelhar esses estilos.
Quando grávida do Kéu eu era participante ativa de um fórum de gestantes. Organizei um encontro e desde então somos muito amigas. Nossos filhos têm diferença de dias ou poucos meses.
Como na vida real as meninas com as quais tive mais afinidade me ligam, quando vêm a Curitiba passam aqui em casa. Ah, mais uma coisa que possivelmente vc não sabia: Sou madrinha virtual de 8 crianças da idade do meu filho. Algumas visitei ainda na maternidade e outras já vieram aqui em casa.
Existe uma linha tênue entre o virtual e o real e vc pode transpô-la a qualquer momento. Acho inclusive que relacionamentos reais podem em algum ponto da vida tornar-se virtuais.
Sabe amiga, você é interessante em qualquer veículo que você se apresentar. Espero que na sua vida passem pessoas tão legais e ricas quanto você.

Anônimo disse...

Os tais affaires me deram o que pensar, hoje. Depois de passar três horas revirando leis, súmulas, resoluções e consultas - além da sacrossanta doutrina - não conseguia esclarecer um mero detalhe, que já estava mesmo me dando nos nervos concurseiros. Foi aí que me lembrei de ter te emendado quando você escreveu "affair". Pra mim, sempre foi "affaire", como a Bíblia, aliás, o Petit Robert (Petit que tem 1500 páginas) consigna. Mas Deus - ou o Google - refere o dobro de citações na forma que você preferiu. Além disso, em francês a palavra significa uma relação de negócios, de trabalho, e não une liaison. Mas como pode também significar um escândalo, imaginei que o sentido poderia existir, por extensão, e tivesse sido desprezada como modernice pelo Robert. Mas esse significado nem é tão novo e ao Robert nada escapa, como escapa nada ao Google. Entre um deus antigo e um novo, meu coração balançou. E ainda continuava me afligindo o que o Legislador haveria realmente dito sobre o tempo da propaganda política. Só quem se mete nos pântanos, florestas e labirintos legislativos kafkianos consegue conceber a magnificência do Legislador. Aquele Inquisidor de Dostoievski não lhe chega aos pés. Mas... o affaire! Não demorou pra notar isto: tudo indica que o americano - eis que o inglês jamais faria isso!- intuiu que só em francês uma aventura amorosa é aventurosa mesmo e da palavra que queria dizer "transação" fez uma que significava "transa". E decerto lhe tirou a última letra pra não tropeçar na pronúncia (tirando o "r", que de soteropolitano se tornou sorocabano). Em francês, enfim, pode até haver um "affaire Dreyfus", perfeitamente rumoroso, mas nada excitante. No inglês - jeca, naturalmente - é que passou a ser osadia, e sem "e".
Meu braço quase torcido traz entanto uma surpresa salvadora. O Houaiss registra "affaire" no sentido novo, como a dizer que até podemos aceitar as invenções de sentido americanas, mas nem por isso precisamos mutilar o idioma original. E, bem à brasileira, cabe concluir: escreva como quiser, mas com "r" baiano. E é melhor agora eu voltar para o Legislador e sua fúria legiffairante. Sou legifera ferida...